Quarta-feira, 27 de Novembro de 2024
Por Redação Rádio Pampa | 13 de maio de 2022
Um consórcio internacional lançou hoje o mais detalhado mapeamento já feito de células individuais do corpo humano. Usando uma tecnologia nova, o projeto HCA (Human Cell Atlas) conseguiu mapear quais partes do DNA estavam sendo ativadas em mais de 500 tipos diferentes de células em 30 tecidos do organismo, permitindo que fosse feito um perfil molecular detalhado de cada uma delas.
“O que apresentamos é como se fosse um Google Maps do corpo humano, com a localização individual das células nos tecidos”, afirmou em entrevista coletiva Sarah Teichmann, geneticista do Instituto Sanger da Inglaterra e uma das líderes do projeto.
Descrito em quatro estudos na revista Science, o projeto apresenta um grande mapa de mais de 1 mihão de células humanas, coletadas de 68 doadores diferentes. De forma similar ao Projeto Genoma, o HCA estabelece um marco na pesquisa biomédica não pelo anúncio de uma descoberta específica, mas pela criação de uma ferramenta que pode acelerar a ciência da área.
“As pessoas pensam no genoma como se fosse o ‘projeto’ do organismo, o que não é muito correto”, afirmou Stephen Quake, professor de bioengenharia da Universidade Stanford, da Califórnia, outro coordenador do HCA. “O genoma é mais bem descrito como uma lista de componentes, e cada célula usa conjuntos diferentes desses componentes. O que estamos fazendo agora é entender e interpretar como diferentes partes do genoma podem ser usadas para definir tipos de células. Assim, criamos definições moleculares para todos os tipos diferentes de células que estudamos.”
O trabalho apresentado agora não é ainda um mapa completo do corpo humano, que é a meta final do projeto.A fase inicial do trabalho cobre órgãos no corpo inteiro, incluindo rins, pulmões, coração e sistema nervoso, mas entrou em maior detalhamento na investigação das células imunes.
O consórcio foi liderado por universidades e institutos pesos-pesados na área, além de Stanford e do Sanger, o grupo tem muitos cientistas do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts e das universidades Harvard, Columbia e de Cambridge. O esforço total envolve mais de 2.000 cientistas em mais de 80 instituições, incluindo o Laboratório Nacional de Biociências, de Campinas (SP).
Os cientistas têm a ambição de que o novo atlas de células seja não um substituo para o genoma humano, que já completou 20 anos de existência, mas algo que amplie seu potencial em pesquisa biomédica.
“Todas as celulas no corpo tem o mesmo DNA. Ainda assim, determinadas doenças se manifestam só em tecidos específicos, em certos órgaos, e isso acontece baseada nos genes que as células efetivamente usam, ou expressam”, diz Aviv Regev, do MIT, uma das cientistas pioneiras no desenvolvimento da tecnologia que permitiu a construção do novo atlas.
O que ela faz é mapear dentro de cada célula a produção de diferentes sequências de RNA, molécula auxiliar do DNA usada para a produção de proteínas, os componentes que efetivamente atuam no organismo. Com base nesses perfis, é possível dizer quais trechos de DNA, ou genes, estão ativos em cada diferente tecido.
“Isso nos permitirá desenvolver diagnósticos mais preciso para pacientes e buscar novos tratamentos”, diz. Uma grande utilidade do mapa é entender a toxicidade de substâncias, porque ele ajuda a descobrir quais tipos de células são capazes de interagir com uma dada molécula.
Foco no sistema imune
Os estudos, assinados por 160 autores, não apenas apresentam as novas ferramentas de pesquisa criadas, mas já mostram um pouco do que o sistema é capaz. O foco no sistema imune empregado na etapa inicial do HCA foi interessante, porque essas células existem como “migrantes” em diferentes órgãos do corpo.
Segundo a pesquisadora, o novo mapa celular já tem implicações para terapias que estimulem ou suprimam a resposta imune para combater doenças e para projetar vacinas, sobretudo em linfócitos T, células imunológicas.
O Atlas Celular Humano é um projeto que foi possibilitado por um conjunto de tecnologias que emergiram aos poucos ao longo da última década. Uma delas foi a capacidade de sequenciar os genes ativos de células individuais em amostras congelados, o que é muito difícil em alguns tipos de tecido. Aviv, do MIT, teve um papel crucial nessa frente.
A ideia dos pesquisadores era ter encerrado essa fase inicial do projeto ainda em 2020, mas a pandemia de covid se interpôs no caminho dos cientistas. Vários dos laboratórios recrutados para o HCA acabaram interrompendo pesquisas para estudar o coronavírus. A tecnologia de sequenciamento de RNA células individuais foi usada para estudar quais células humanas são mais suscetíveis ao Sars-CoV-2, e estudos feitos pelos pesquisadores já ajudaram a guiar a pesquisa de tratamentos e diagnósticos nos últimos dois anos.
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