Quarta-feira, 27 de Novembro de 2024

Home Variedades Como funciona implante para tratar depressão resistente aplicado pela 1ª vez no Brasil

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Pela primeira vez no Brasil, dois pacientes receberam implantes de um aparelho de estimulação do nervo vago para tratar depressão resistente. O tratamento, que já vinha sendo usado em pacientes com crises epilépticas, consiste em estimular diretamente o cérebro: o implante ativa o nervo vago, que envia sinais elétricos ao órgão, afetando os neurotransmissores e as áreas cerebrais associadas ao humor.

“O que se observou nos pacientes que tinham crises de epilepsia e também sofriam com depressão é que ambos os quadros acabavam melhorando com o uso dos implantes. E aí começou-se a estudar quais seriam os mecanismos do sistema nervoso em que poderiam explicar aquela melhora”, descreve o médico Wuilker Knoner Campos, presidente da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia.

Os resultados das pesquisas levaram à autorização do uso do dispositivo em pacientes com depressão resistente nos Estados Unidos, na Inglaterra, e, em 2019, no Brasil – o terceiro país a oferecer a alternativa de tratamento.

As cirurgias foram realizadas no dia  (11) por Knoner Campos no Hospital SOS Cárdio, em Florianópolis (SC).

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou que o sistema que será usado, da marca LivaNova, tem indicação para o “tratamento da depressão crônica ou recorrente para pacientes que estejam em um importante episódio depressivo resistente ao tratamento ou intolerante ao tratamento.”

De acordo com o neurocirurgião, os pacientes foram escolhidos pela área de psiquiatria do hospital. Para receber o implante, eles tinham que ter passado, sem resultados suficientemente satisfatórios, por outros tratamentos já estabelecidos para depressão resistente.

Esses tratamentos incluem o uso de cetamina (um anestésico aprovado pela Anvisa para esse fim em 2020); a estimulação magnética transcraniana, uma técnica não invasiva que envolve a aplicação de campos magnéticos de baixa intensidade para estimular áreas específicas do cérebro; e a eletroconvulsoterapia, que envolve a indução controlada de convulsões por meio da aplicação de correntes elétricas no cérebro.

“Um deles é médico e, na realidade, tinha alguma resposta ao fazer a eletroconvulsoterapia, que hoje é considerada o tratamento padrão ouro para o quadro, mas sofria com lapsos de memória, que é um dos possíveis efeitos colaterais. Além disso, esse tratamento (eletroconvulsoterapia) requer que o paciente seja sedado, então a cada sessão é um dia ‘perdido’.”

No contexto brasileiro, o tratamento é ainda considerado bastante recente e não é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Para que um paciente seja elegível para o implante, é necessário que receba uma recomendação por parte de um psiquiatra e seja encaminhado a um neurocirurgião familiarizado com a tecnologia.

De acordo com Campos, após as primeiras cirurgias, é esperado que o procedimento se torne mais popular dentro da rede privada de saúde.

Como funciona o implante

Para compreender como o implante age contra a depressão, é fundamental explorar as funções influenciadas pelo nervo vago – alvo do tratamento. Este nervo, que se estende do crânio aos órgãos abdominais, desempenha um papel vital na regulação de diversas funções orgânicas, incluindo coração, pulmões e intestino.

“No tronco cerebral, encontramos o ‘núcleo do trato solitário’, onde as fibras do nervo vago estão conectadas. Esse núcleo processa informações de todo o corpo e reage a alterações, como o aumento da frequência cardíaca. Ele também intercede em problemas, como distúrbios digestivos, regulando a acidez. Esse controle neurológico é crucial, com o nervo vago desempenhando um papel central.”

A teoria do uso do estimulador de nervo vago na depressão baseia-se na influência positiva nos aspectos cerebrais do humor e regulação emocional.

Estudos sugerem que a estimulação do nervo vago pode modular redes neurais desequilibradas na depressão, contribuindo para a melhoria dos sintomas.

A forma como o aparelho estimulador é implantado se assemelha muito à do popular marca passo. Na cirurgia, uma incisão é feita para colocá-lo sob a pele abaixo da clavícula esquerda ou próximo da axila esquerda.

Na sequência, uma segunda incisão é realizada no pescoço para fixar três pequenos eletrodos ao nervo vago esquerdo, e esses eletrodos são ligados ao gerador por um condutor sob a pele. O paciente fica sob anestesia geral durante o procedimento e é esperado que receba alta no mesmo dia.

“Os riscos da cirurgia são considerados muito baixos – são relacionados à cirurgia em si [como infecção, sangramentos e coágulos sanguíneos], e não ao aparelho. Os efeitos colaterais são leves e incluem rouquidão, tosse e soluço, que podem ocorrer porque o nervo vago está ligado ao diafragma”, aponta o neurocirurgião Wuilker Knoner Campos.

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