Sexta-feira, 22 de Novembro de 2024
Por Redação Rádio Pampa | 2 de janeiro de 2022
Existe um lugar delicado, na maioria dos corações, reservado para os donuts (em inglês, doughnut): a textura fofa, o revestimento crocante e brilhante, a doçura tão doce que poderia até fazer você abandoná-los, mas não faz, pelo menos não por muito tempo.
Em padarias, o brilho amarelo quente de bandeja sobre bandeja de donuts recebeu muitos fregueses matutinos e aliviou o estresse de muita gente.
Os donuts, como normalmente os imaginamos hoje em dia, são uma comida relativamente jovem. A versão norte-americana, conhecida por esse nome em lojas mundo afora, parece ter suas origens nas décadas da Revolução Americana, quando um doce holandês ganhou uma nova identidade.
Ao ler histórias sobre o donut, você pode se surpreender ao descobrir que sua confecção é há tempos marcada pelo nacionalismo. Ao mesmo tempo em que a nova nação dos Estados Unidos tentava encontrar seu lugar no mundo, seus cidadãos tentavam identificar o que era essencial a respeito do país – sobre sua literatura, seu caráter nacional, sua cozinha. Isso significou que escritores e comentaristas olhavam para trás na (relativamente curta) história da nação com uma espécie de nostalgia misturada com bravata.
Antes de Nova York ser Nova York, claro, a cidade era Nova Amsterdã, e escritores sempre refletiram sobre os costumes holandeses de eras anteriores com uma doce afeição. Um desses costumes era a confecção de bolas de massa fritas, conhecidas como oliekoecken, ou tortas de óleo. Uma receita dessas delícias aparece num livro de receitas holandês do século 17: elas são fermentadas e cravejadas com frutas secas.
Folclore
Uma das primeiras menções de donuts em textos americanos veio de Washington Irving, escritor e diplomata, mais conhecido pelas obras The Legend of Sleepy Hollow (A Lenda de Sleepy Hollow) e Rip Van Winkle. Em seu Knickerbocker’s History of New York (A História de New York por um Nova-iorquino), de 1809, ele passa um bom tempo falando sobre pitorescas tradições folclóricas américo-holandesas, descrevendo as “primitivas festas de chá” de um passado não muito distante.
Identificar o donut como uma comida simples e folclórica fez dela mais que uma sobremesa – deu-lhe a cor de uma delícia americana autêntica (o nome, por falar nisso, como conta Jon Townsend do canal 18th Century Cooking, no YouTube, pode ter derivado da confecção já bem estabelecida chamada ginger nuts, que são cookies pequenos e arredondados do tamanho de nozes (nuts, em inglês). Os donuts são pequenas bolas de massa (dough, em inglês), então eles são “nuts”).
As fantasias de singela bondade em torno dos donuts continuaram. Mais de 50 anos depois que Irving escreveu sobre eles, os donuts atingiram seu moderno formato circular – mas os verdadeiros como e por que dessa transformação perderam-se ao longo tempo, enterrados por uma história envolvendo um marinheiro da Nova Inglaterra e sua mãe. Uma versão dessa lenda diz que a mãe de Hanson Gregory preparou donuts para suas viagens, e ele cravou em uma das alças do timão para comer durante uma tempestade, mas existem quase infinitas variações.
A cultura dos barcos baleeiros da Nova Inglaterra também envolveu o que provavelmente foram donuts levemente suspeitos. Com enormes quantidades de gordura de baleia no barco, depois de uma captura e muitos tonéis à disposição, fritar era a coisa lógica a fazer, relata Michael Krondl em seu livro The Donut: History, Recipes, and Lore from Boston to Berlin (O Donut: História, Receitas e Tradições de Boston a Berlim).
Gosto de casa
O folclore dos donuts pode ter atingido seu auge com as garotas donuts da Primeira Guerra Mundial, voluntárias do Exército da Salvação que fritavam donuts para tropas americanas. Centenas de milhares deles foram distribuídos próximo às trincheiras, e há inúmeros cartazes e tributos à devoção dessas mulheres para levar um gosto de casa aos soldados. A imagem do Exército da Salvação também foi elevada.
Mas, para pelo menos uma garota donut, o prazer do doce havia acabado. Helen Purviance, que segundo relatos fritou 1 milhão de donuts durante a guerra, foi entrevistada pelo jornal The New York Times em um evento do Exército da Salvação, para levantar fundos, em que ela preparou donuts no hotel Savoy. “Miss Purviance contou que não gostava do trabalho de cozinhar donuts”, disse a reportagem. “Ela disse que ela passou a associar o ato de fritar donuts com os ‘horrores da guerra’.” “Não existe glória na guerra”, disse ela.
De fato, apesar de toda a alegria que o donut traz, fritar uma massa é algo que você faz quando você não tem mais nada melhor – num navio baleeiro, por exemplo, ou numa trincheira enlameada.
O donut da loja moderna pode estar embrulhado numa narrativa de deleites simples. Mas a massa frita é uma confortadora de almas, em circunstâncias de sofrimento ou outras, por todo o mundo. Olhe além das opções comuns, e você encontrará um donut em praticamente toda cultura, cada uma delas com suas próprias histórias, seus próprios romances, seus próprios devotos que lhe contarão exatamente o que faz um donut ficar bom.
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