Sexta-feira, 22 de Novembro de 2024
Por Redação Rádio Pampa | 7 de agosto de 2023
De baladas LGBTQIA+ a festivais e festas infantis, os cruzeiros no Brasil viraram uma febre com promessas não apenas de viagens inesquecíveis em alto-mar, mas de levar turistas para um multiverso feito sob medida para cada público. Com altura de prédios de 25 andares, as embarcações gigantes incorporaram, além do open bar e das suítes com vista, cinema 4D, show da Broadway, simulador de pista de F1 – e o que mais a imaginação permitir.
Após a tormenta da pandemia, a expectativa é de bons ventos no mar. O número de fretamento de embarcações cresceu para eventos temáticos ou viagens com artistas – de Wesley Safadão a Xuxa – e jogadores de futebol como Neymar. Uma das maiores empresas de aluguel de embarcações, a MSC viu o negócio crescer 430% este ano, quando comparado a 2019.
O fenômeno se explica pela percepção de que os cruzeiros são uma ilha da fantasia e de que o que acontece no deck fica no deck, somado à presença cada vez maior de jovens. A Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos (Clia Brasil) projeta que, até 2028, a geração Z (até 23 anos) deve tomar o lugar dos millenials entre os apreciadores do gênero, rejuvenescer a tripulação e, de quebra, mudar o comportamento a bordo. Hoje o perfil permanece com mulheres sendo maioria (60,8%), entre 35 e 54 anos, e faixa de renda mensal familiar acima de R$ 5 mil. Noventa e nove por cento dos turistas viajam acompanhados, seja dos filhos e parentes (51,9%), cônjuge (24,7%), ou amigos (19,5%).
Aos poucos, a idade vai diminuindo, e os interesses se diversificando. Abatido pelo isolamento, o produtor de eventos Alex Zanella, de 32 anos, comprou em 2020 – no auge da Covid-19 – um pacote para um cruzeiro gay por R$ 2 mil, quase uma pechincha, já que o preço normal seria cerca de R$ 4,5 mil. Ele embarcou com 11 amigos para um périplo entre Santos (SP), Ilhéus (BA), Búzios (RJ) e Ilhabela (SP). Alex queria o balanço das ondas, sol, boa comida e, claro, sexo. A experiência foi aprovada em quase todos os quesitos, e o rapaz espera repeti-la em breve. Mas ele se chocou com a quantidade de drogas, uma preocupação das empresas e da polícia.
“Gostei demais. Porém, no banheiro, havia uma quantidade enorme de pessoas se drogando. Isso foi uma coisa muito louca”, conta.
Liberdade e mordomias
No Brasil, todos os portos com chegadas e saídas de navios são fiscalizados pela Polícia Federal. Em maio, em águas internacionais, quatro brasileiros se passaram por influencers, no que parecia quase uma paródia dos modelos Carl e Yaya do filme “Triângulo da tristeza”. O desfecho foi tão surpreendente quanto o do cinema: todos foram presos com 95 kg de cocaína avaliados em 5 milhões de euros, ou R$ 26,7 milhões.
A diversão ser atravessada por casos policiais não chega a ser incomum. Na linha “navegar é preciso, mas tenha cuidado”, Letícia Manso, de 28 anos, viu catarinenses sendo presos por tráfico em abril do ano passado, em Marselha. Eles levavam 12 quilos de cocaína, algo como R$ 2,5 milhões dentro das malas.
“O grupo quebrou vidros, gritou e quase bateu no capitão. Era um protesto porque o navio não pararia num determinado porto. Quando paramos em Las Palmas e a empresa pagou um transfer para quem quisesse ir a Tenerife (ilha da Espanha na rota do tráfico), eles foram presos.”
Desafios à parte, os transatlânticos caíram no gosto popular. O craque Neymar acena com um passeio no fim deste ano para seis mil passageiros num barco de 333 metros de comprimento, a preços a partir de R$ 5 mil. Extravagância que virou vício para o bancário Thiago Guimarães, de 35 anos. Desde 2016, ele já contabiliza 18 cruzeiros, sendo que em todos fez questão de ficar hospedado com o marido nas cabines mais exclusivas, de R$ 30 mil. Com direito a mordomos 24 horas.
O interesse por desbravar oceanos injetou, na temporada 2022/2023, R$ 3,6 bilhões na economia do país, um crescimento de 240% em relação ao período anterior. O valor expressivo representa praticamente a bilheteria mundial do filme Barbie. De outubro de 2022 a abril deste ano, estima a Clia Brasil, o Brasil teve 700 mil cruzeiristas, o número mais alto da década.
“As companhias estão buscando para o portfólio mais turismo sustentável e aumentado a oferta de cabines individuais para os que gostam de viajar sozinho, além de apostar em acessibilidade para quem tem baixa mobilidade”, explica o presidente da entidade, Marco Ferraz, acrescentando que a meta é tornar os cruzeiros acessíveis a 2% da população. Nos EUA, o percentual chega a 4%, na Austrália, a 6%.
O sonho de navegar também move o mercado de trabalho. E, nele, a geração Z é uma realidade. Com 19 anos, Emanuelle Nunes foi contratada no ano passado para trabalhar na limpeza do Royal Caribbean, o que teve gosto de aventura já que nunca tinha feito uma viagem internacional. Há um ano dividindo um beliche com uma colega de trabalho, ela não se arrepende mesmo tendo, muitas vezes, que se equilibrar entre agradar o passageiro a todo custo e recusas gentis para pedidos inusitados como o de mergulhar na piscina com um hóspede. Emanuelle já visitou mais de 20 países.
“Aqui é um choque de realidade, parece filme. Vi gente gastar mais de US$ 40 mil (ou R$ 193 mil) num quadro vendido a bordo”, diz, observando que gringos têm preferência especial por Romero Brito, popular no acervo marítimo.
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