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Por Redação Rádio Pampa | 12 de junho de 2023
Quando começou a invasão russa à Ucrânia? E em que ano as primeiras vacinas da covid foram aplicadas? Se você tem dificuldade para lembrar a data certa de algum evento dos últimos três anos, um novo estudo publicado na revista científica PLOS One mostra que isso pode ser parte de um fenômeno mundial.
Pesquisadores da Escola de Psicologia da Universidade de Aberdeen, na Escócia, conduziram um pequeno experimento com 277 pessoas em que avaliaram a memória em relação a grandes eventos ocorridos entre 2017 e 2021.
A principal conclusão foi: a pandemia e o isolamento social devido à crise sanitária afetaram a noção de tempo dos indivíduos e a capacidade de relembrar com facilidade o momento em que acontecimentos mundialmente relevantes ocorreram.
“Descobrimos que as pessoas não conseguiam se lembrar quando os eventos aconteceram durante a pandemia. Na verdade, sua precisão para lembrar o momento desses eventos era tão ruim quanto para os eventos que aconteceram três ou quatro anos antes. Efetivamente, o que a pandemia fez foi tirar a capacidade de lembrar quando os eventos aconteceram”, diz o professor Arash Sahraie, autor do trabalho, em comunicado.
Para chegar a essa conclusão, Sahraie e uma de suas alunas, Daria Pawlak, conduziram um questionário online em maio de 2022 com os quase 300 voluntários no Reino Unido. Entre as perguntas, estavam quando grandes eventos como a saída britânica da União Europeia, o “brexit” e o encalhe do navio Evergreen no canal de Suez, no Egito. Os participantes precisavam selecionar um ano entre 2016 e 2022.
Eles analisaram as respostas sobre a data dos eventos e também informações dadas a outras perguntas que questionavam os voluntários sobre fatores relacionados à saúde mental, como ansiedade, depressão, carga mental e física, tédio e resiliência.
Como resultado, constatou-se que a capacidade de se lembrar dos eventos em 2021 era pior do que a de rememorar quando os acontecimentos de 2019 e de 2020 ocorreram. Além disso, era semelhante à capacidade de lembrar os eventos de 2017 e 2018, enquanto os fatos mais antigos deveriam ser mais difíceis.
“Esperava-se que a lembrança dos participantes de eventos que ocorreram no passado fosse menos precisa. Mas sua percepção do momento dos eventos que ocorreram em 2021 – um ano antes da pesquisa – foi tão imprecisa quanto a dos eventos que ocorreram três a quatro anos antes”, escreveu o professor em artigo sobre o estudo publicado no site The Conversation.
Ao correlacionar com as respostas sobre estado mental, os responsáveis apontaram ainda que a precisão para se lembrar dos eventos foi pior entre aqueles com sinais mais altos de ansiedade, depressão e estresse. Já aqueles com níveis mais altos de resiliência tiveram um desempenho melhor.
“Nosso ponto de partida (do estudo) foram comentários anedóticos de nossos colegas clínicos que achavam difícil determinar com precisão os cronogramas das condições médicas de seus pacientes. Em particular, eles sentiram que os pacientes não estavam relatando corretamente eventos como o início dos sintomas se tivessem começado durante a pandemia”, diz Sahraie no artigo.
Memória
O autor do estudo acredita que o impacto da pandemia na capacidade de se lembrar dos eventos é devido à forma como o estado psicológico consegue alterar a percepção da passagem de tempo. Por exemplo, ao sentir que o dia “desacelera” quando não há tarefas a serem feitas.
Além disso, ele explica que existem marcadores que ajudam a delimitar os acontecimentos na linha do tempo. E que o isolamento social, com a redução de eventos sociais do cotidiano, teria influenciado esse cenário.
“Se você estiver em uma colina, terá à sua frente uma paisagem. Você pode olhar ao redor e ver sua posição em relação a alguns pontos de ancoragem, como prédios famosos e colinas, e então descrever todos os outros lugares e a que distância eles estão desses pontos de ancoragem”, explica o professor, e continua:
“Existe um equivalente chamado ‘timescape’. Isso é saber onde você está atualmente em relação a todos os eventos ao longo da linha do tempo. (Mas) as restrições relacionadas à pandemia removeram todos os pontos de ancoragem habituais no tempo, como comemorações de aniversário, funerais, feriados e confraternizações que nos permitem colocar eventos neste cenário. Sem os pontos de ancoragem, os eventos se fundem”.
No estudo, eles citam que esse fenômeno de distorção do tempo é algo comum observado entre detentos em presídios.
No Ar: Pampa Na Tarde