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Por Redação Rádio Pampa | 17 de fevereiro de 2022
Nos últimos dois anos, muitas pessoas desenvolveram rotinas de trabalho e descanso diferentes das que estavam acostumadas, devido às condições impostas pela pandemia de covid. Nesse contexto, o sono passou a ser algo fragmentado para várias delas — uma mudança voluntária ou não, dados os níveis de estresse do período. E, sem saber, trouxeram de volta um ciclo natural que, acredita-se, tenha sido o padrão no Ocidente desde o final da Idade Média até o início do século 19.
Naquela época, muitas pessoas iam dormir assim que o sol se punha e acordavam três a quatro horas depois. Elas então socializavam, liam livros, faziam pequenas refeições e transavam por uma ou duas horas, antes de voltar a dormir por mais três a quatro horas. Somente quando a luz artificial foi introduzida é que as pessoas começaram a se forçar a dormir durante a noite, disse Roger Ekirch, professor de história da Virginia Tech e autor de “The Great Sleep Transformation” (A grande transformação do sono, sem tradução no Brasil).
Ekirch, que estudou o sono segmentado nos últimos 35 anos, disse que há mais de 2 mil referências ao tema em fontes literárias: tudo, de cartas a diários, registros judiciais, jornais, peças de teatro, romances e poesias, de Homero a Charles Dickens.
“O fenômeno recebeu nomes diferentes em lugares diferentes: primeiro e segundo sono, primeiro cochilo e sono profundo, sono noturno e sono matinal”, disse Benjamin Reiss, professor de inglês da Universidade Emory, na Geórgia, e autor de “Wild Nights: How Taming Sleep Created Our Restless World” (Noites selvagens: Como o sono domado criou nosso mundo inquieto, sem tradução no Brasil).
Segundo ele, não era uma escolha, mas algo que as pessoas faziam porque se encaixava nos padrões de trabalho agrícola e artesanal. Naquela época, além de ser um período útil para se conceber um bebê, o período de vigília também era considerado um horário nobre para tomar poções e remédios e para ajudar na digestão (dormia-se de um lado do corpo durante o primeiro sono e depois do outro lado durante o segundo sono), explicou Ekirch.
Não havia pressão para chegar à fábrica a tempo, pegar um trem ou mandar as crianças para a escola, já que a maior parte do trabalho era feito dentro ou perto de casa, disse Reiss. O sono não era governado pelo relógio, mas pelos ritmos da noite e do dia, bem como pelas mudanças das estações, acrescentou. Mas havia também motivos negativos para o sono segmentado.
“As superfícies para dormir, muitas vezes um saco cheio de grama, ou com sorte, lã ou crina de cavalo, tornavam mais difícil do que hoje dormir por um longo período sem interrupção”, disse Reiss.
Rotina “artificial”
Tudo mudou com a Revolução Industrial, enfatizando o lucro e a produtividade — a crença era de que as pessoas que limitavam o sono a um único intervalo tinham vantagem. E a crescente prevalência de luzes artificiais permitiu dormir mais tarde, levando à compressão do sono. Passadas algumas centenas de anos, nos acostumamos. Bem, alguns de nós, pelo menos.
Trinta por cento das pessoas relatam acordar durante a noite pelo menos três vezes por semana, de acordo com um estudo publicado em 2010 no Journal of Psychosomatic Research, e 25% dos adultos sofrem de insônia anualmente, de acordo com um estudo recente da Universidade da Pensilvânia. Para algumas pessoas, a pandemia estimulou horários mais flexíveis, o que levou a experimentos com o antiquado método de sono.
Esse é o caso de Mark Hadley, um gerente financeiro de 52 anos em North Bend, Oregon. Nos últimos 20 anos, Hadley disse que não se lembra de um dia em que tenha dormido uma noite inteira.
No entanto, os médicos não têm certeza sobre o quão saudável é o sono segmentado.
“Nós realmente não sabemos os impactos a longo prazo do sono segmentado porque não temos muitos dados sobre isso”, disse Matthew Ebben, professor associado de psicologia em neurologia clínica no Centro Médico Cornell, em Nova York.
Isso pode fazer com que algumas pessoas se sintam mais cansadas e sonolentas ao longo do dia, disse Nicole Avena, psicóloga da saúde e professora assistente de neurociência na Escola de Medicina Monte Sinai. Além disso, o sono segmentado exige que os indivíduos vão para a cama mais cedo, o que pode não funcionar com muitos horários, afirmou.
Remédio contra a insônia
Para Danielle Hughes, de 33 anos, o sono segmentado foi um remédio para a insônia. Moradora de Dublin, na Irlanda, ela passou um ano inteiro visitando médicos para tentar encontrar uma solução para seus despertares no meio da noite. Até que finalmente pesquisou seu problema no Google e se deparou com o sono segmentado.
Em casos como esse, de ansiedade provocados por insônia, o sono segmentado costuma ser a solução ideal, disse Alex Savy, coach de ciências do sono e fundador do SleepingOcean, um site de análise de produtos para dormir em Toronto.
“Ao praticar o sono segmentado, os insones não precisam se preocupar em acordar no meio da noite, pois é assim que o sono segmentado funciona”, disse Savy. “Portanto, eles podem ajustar a programação à sua insônia e reduzir o estresse associado a ela.”
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