Quarta-feira, 27 de Novembro de 2024
Por Redação Rádio Pampa | 21 de julho de 2022
Há quase trinta anos, em dezembro de 1992, o assassinato da atriz Daniella Perez, de 22 anos, causou uma comoção nacional. Daniella estava no auge da carreira e contracenava com o ator Guilherme de Pádua na novela ‘De Corpo e Alma’, da TV Globo, quando foi morta por ele e por sua então esposa, Paula Thomaz. As investigações apontaram que a jovem atriz foi morta com 28 punhaladas e sem direito e tempo para se defender. O corpo dela foi encontrado num local descampado no Rio de Janeiro.
A escritora Gloria Perez, mãe de Daniella e autora da novela, abriu seus arquivos e autos do processo para o documentário ‘Pacto Brutal, o assassinato de Daniella Perez’, da HBOMax, que estreou nesta quinta (21). Em entrevista à BBC News Brasil, a novelista diz: “Quanto mais violentos são os crimes, mais benevolentes são as nossas leis penais”.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
Em sua opinião, a revolta contra crimes violentos, incluindo casos como o do anestesista que estuprou uma mulher durante o parto, é da sociedade e não do Legislativo, responsável por fazer leis que a Justiça aplica.
Como foi revisitar detalhadamente o crime da sua filha e tanto tempo depois? Qual é seu sentimento?
Gloria Perez – É uma dor, um vazio que sempre estará ali, não importa quanto tempo passe.
No documentário, a senhora diz que só existe uma verdade e várias versões. Qual seria a maior verdade?
Gloria Perez – O documentário tem como foco os autos do processo. É isso que ele traz de novo. O que ficou conhecido são as muitas versões sensacionalistas com que os assassinos alimentaram a imprensa durante os anos de espera para o julgamento. É através dos autos que você pode entender porque nenhuma dessas versões restou de pé e por que os dois — Guilherme de Pádua e Paula Peixoto — foram condenados por homicídio duplamente qualificado, com motivo torpe e recurso que impossibilitou a defesa da vítima.
No documentário, a senhora diz que ‘tudo parecia lindo’, ‘uma estrada linda, aberta’, ‘com coisas boas no horizonte’, naquele momento da vida de vocês (a sua e da ‘Dany’), mas que, ‘de repente tudo explodiu, foi sugado’. Como é lidar com o fato de os assassinos estarem livres?
Gloria Perez – Dói muito para quem perdeu filhos em assassinatos brutais se confrontar com a realidade do quanto a vida humana é barata entre nós. Os dois assassinos, mesmo condenados por homicídio duplamente qualificado, ficaram presos pouquíssimo tempo, cercados de todas as mordomias que o dinheiro compra. E estão aí, nas redes sociais, exibindo sua impunidade.
No portal da Daniella Perez, a senhora escreveu que a então liberdade de Guilherme de Pádua, 48 horas depois do crime, revelou, na sua visão, que ‘matar não dava cadeia’. A situação mudou desde então ou a legislação segue insuficiente diante da brutalidade?
Gloria Perez – Não era a minha visão: estava na lei. O homicídio qualificado não tinha sido incluído na lista dos crimes considerados hediondos, aqueles em que a pena era mais dura e se exigia mais tempo de cumprimento antes de qualquer benefício. O que a emenda popular que nós conquistamos fez foi introduzir o homicídio qualificado nessa lei dos crimes hediondos, que já não tem o rigor daquela época e a cada dia se torna mais branda.
A senhora diz que a lei mudou, mas continua branda para a atualidade? Nova emenda popular seria necessária? A que a senhora fez na época teve 1 milhão de assinaturas e apoio de líderes religiosos.
Gloria Perez – 1.300.000. Essa emenda tem a importância também de ter indicado um caminho, de ter alertado a sociedade de que ela pode propor e fazer passar uma lei. Outras vieram depois.
Ainda hoje o feminicídio tem estatísticas epidêmicas e o noticiário está cheio de casos de violência contra a mulher, como o caso do anestesista estuprador durante o parto. A senhora acha que o Brasil tem aprendido alguma coisa com crimes trágicos como o da Daniela?
Gloria Perez – Quanto mais violentos são os crimes, mais benevolentes são as nossas leis penais. Na matemática da justiça brasileira, a pena aplicada aos réus, por mais alta que seja, é só para impressionar. Na prática, ela se dissolve em quase nada. A revolta é da sociedade, como você está vendo no caso do médico. Não do Legislativo, responsável por fazer as leis que a justiça aplica.
A senhora chegou a ter contato com os assassinos da Daniella nestes anos quase 30 anos?
Gloria Perez – Nunca, Deus me poupou de encontrá-los e só espero que continue poupando.
A senhora tem alguma esperança de que este caso seja reaberto?
Gloria Perez – O caso está encerrado, já foi julgado e transitado em julgado. Não há mais nada a acrescentar nem a polemizar.
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