Quarta-feira, 27 de Novembro de 2024

Home Celebridades “Medo não faz parte da minha vida”: a rebeldia de Gal Costa nos anos de chumbo

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Gal Costa tinha 24 anos e era uma artista em franca ascensão quando fez um ensaio de fotos para um jornal carioca perto de um bar tradicional de Ipanema, no Rio, em outubro de 1969. Nascida e criada em Salvador, a cantora havia chegado à capital fluminense quatro anos antes, seguindo os passos de amigos de palco baianos como Maria Bethânia, Caetano Veloso e Gilberto Gil.

“Minha família insistiu para eu não vir. Queriam que eu trabalhasse numa repartição. Vê se pode”, disse ela durante uma entrevista já em 1970, quando estava enfurnada no seu apartamento, também em Ipanema, tentando compor músicas próprias para um próximo disco. “O importante é ousar. Esta é uma necessidade orgânica que eu tenho. O medo não faz parte da minha vida.”

Maria da Graça Costa tinha um jeito meio aéreo de conversar, mas ela não esteve neste mundo a passeio. Durante entrevistas, podia até não se posicionar politicamente com a firmeza de diversos artistas de sua época. Também não compunha músicas de contestação. Mas a sua atitude no palco e nas gravações em estúdio durante os anos de recrudescimento da ditadura militar, quando potestar foi urgente, fala por si só.

Gal alcançou grande projeção no fim dos anos 1960, ao gravar músicas como “Baby”, de Caetano, e “Que pena”, de Jorge Ben. Apesar de inserida na agitação estética da Tropicália, a cantora era, até então, bastante associada à bossa nova. Não que ela achasse isso ruim. O violão de João Gilberto fora, de fato, o responsável por despertar na artista o encantamento pela música, na adolescência.

Mas, em novembro de 1968, portanto semanas antes do Ato Institucional 5 (AI-5), a jovem soteropolitana surgiu no IV Festival da Música Popular Brasileira, completamente repaginada, de visual moderno, coberta de adereços espelhados e soltando a voz com uma potência que talvez nem ela soubesse que tinha. Janis Joplin teria aplaudido se estivesse no Teatro Record, em São Paulo.

A poderosa rendição de “Divino maravilhoso” (Caetano e Gil) que ela entregou ali aproximou sua própria imagem da rebeldia roqueira daqueles tempos e ajudou a tornar essa canção um hino de protesto resgatado até hoje durante manifestações. “É preciso estar atento e forte/Não temos tempo de temer a morte”, bradou Gal Costa de olhos fechados, o corpo curvado para o chão.

Gal achava toda essa histeria da censura do regime militar algo ridículo, que o seu espírito livre mal podia compreender. Em uma entrevista em 2021, quando a baiana de então 76 anos lançou seu último disco, a cantora definiu assim a sua forma de se posicionar politicamente: “Meu passado me mostrou como uma mulher, entre aspas, militante, coisa que nunca fui… Por acaso, fui uma mulher libertadora, no sentido verdadeiro, procurei viver a vida que acreditava e acredito. Mas nunca tive essa personalidade no sentido de militar mesmo (…) Acredito na liberdade e no respeito. Sou uma democrata”.

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