Sábado, 23 de Novembro de 2024
Por Redação Rádio Pampa | 4 de julho de 2023
Uma nova análise de dados sobre dezenas de sociedades de caçadores-coletores ao redor do mundo revela que as mulheres eram caçadoras ativas em pelo menos 79% dessas comunidades. A descoberta é diferente da crença disseminada por estudos arqueológicos tradicionais de que os homens eram os caçadores e as mulheres somente coletoras de plantas e frutas. O estereótipo sobre a divisão do trabalho por gênero pode ter enviesado o resultado de muitos trabalhos ao longo dos anos, alertam especialistas.
“Cada cientista tem suas próprias ideias sobre o que é importante em seus dados”, afirmou Cara Wall-Scheffler, da Universidade de Washington e da Universidade Seattle Pacific, nos EUA, principal autora do estudo. “É por isso que é tão importante ter tantas pessoas diferentes fazendo ciência. Para fazermos descobertas, precisamos ter olhares diversos sobre as informações disponíveis.”
Um volume crescente de evidências arqueológicas já vinha desafiando esse paradigma. Estudos revelaram, por exemplo, a descoberta de mulheres enterradas junto com armas especificamente usadas para caçar animais de grande porte.
Um túmulo viking descoberto em 2017 revelou um indivíduo cercado de armamentos tipicamente associados aos guerreiros mais graduados. Automaticamente, se deduziu que se tratava de um homem. Exames de DNA feitos posteriormente, no entanto, revelaram que se tratava de uma mulher.
Coletoras e caçadoras
Para investigar se tais descobertas seriam eventos isolados ou fatos mais corriqueiros analisados erroneamente por cientistas do sexo masculino ao longo das décadas, cinco pesquisadoras dos EUA (Abigail Anderson, Sophia Chilczuk, Kaylie Nelson e Roxanne Ruther, além de Cara Wall-Scheffler) decidiram estudar dados disponíveis sobre 63 grupos de caçadores-coletores de vários lugares do mundo (América do Norte, América do Sul, África, Austrália, Ásia e Oceania) ao longo dos últimos cem anos.
Elas descobriram que em pelo menos 79% das sociedades analisadas, as mulheres eram também caçadoras, a despeito de serem ou não mães. Ou seja, a ideia de que elas ficariam em casa ou exercendo atividades supostamente menos perigosas por causa das crianças, não procede. Muitas, inclusive, caçavam acompanhadas de crianças.
“Há cada vez mais dados derrubando a ideia de que a mulher estaria impedida de caçar para ficar tomando conta das crianças”, escreveram no trabalho, publicado na semana passada na revista PLOS ONE. “Essas descobertas estão lançando um olhar muito mais rico na nossa compreensão das estratégias de mobilidade humana.”
As pesquisadoras demonstraram também que nas sociedades em que a caça era considerada a atividade de subsistência mais importante, as mulheres sempre participavam ativamente das caçadas. E também que a grande maioria (70%) dessa atividade seria intencional, não apenas oportunista, fruto de algum encontro fortuito com um animal, em meio a outras atividades. E mais: aparentemente elas caçavam animais de todos os portes, dos menores aos maiores.
O trabalho também revelou que as mulheres seriam ativamente envolvidas no ensino da atividade a membros mais jovens do grupo e que usavam uma variedade de armas e estratégias superiores a dos homens. Entre as armas citadas estão machetes, arco e flecha e redes, entre outras. Elas também tinham uma grande variedade de parceiros de caça. Além das crianças, elas também caçavam com outras mulheres, com homens e com cachorros.
“Os dados sugerem que as mulheres não apenas se preparavam para a caçada e perseguiam presas, como também eram habilidosas nesta tarefa”, escreveram no estudo. “Essas evidências contam com o apoio da descoberta de uma gama de armas, bem como de estratégias.”
No Ar: Pampa Na Madrugada