Domingo, 22 de Dezembro de 2024

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Os bolsonaristas dizem com orgulho que Bolsonaro resgatou o patriotismo do povo brasileiro. Pode ser. Mas é preciso primeiro perguntar se isso é bom ou ruim.

Patriotismo – se supõe – é amor à pátria. Desde logo: não se desconsidere um sentido de pertencimento ao torrão natal, à comunidade, ao idioma nacional, aos usos e costumes do lugar. Mas para isso tudo – e mais – não é preciso ser “patriota”.

Uma vez que a pátria é uma abstração – na mesma medida em que o estado é uma ficção jurídica – , o que se queira ter a respeito dela é um sentimento difuso, uma impressão vaga, uma declaração retórica de apreço, de resto insuficientes para gerar uma atitude, uma ação capaz de mudar os rumos, quando eles se encontram em desajuste ou disfunção.

Não vejo grande mérito no patriotismo dos militares, estes patriotas de ofício, profissionais. Afinal é a pátria que lhes paga o soldo – convém, pois, enaltecê-la. Bolsonaro de gaba de patriotismo, mas é de sua lavra o conceito de que (essa gente do PT) “ vem dos grotões, e dos rincões, de onde nada pode sair de bom a não ser esse tipo de gente”. Se dos grotões e rincões, de onde eles (os pobres, os desvalidos) vêm, nada sai de bom, então eles não são dignos da pátria.

A pátria, para ser cultuada, não pode excluir uma parte dos seus concidadãos por causa de sua origem de classe, cor da pele, sexo, idade ou profissão religiosa, ou pela adesão a um partido. A pátria – para se tornar um valor – deve dar abrigo, refúgio e meio de vida decente a todos os seus filhos.

O conceito de pátria separa e diferencia os seres humanos entre si, como se o fato de terem nascido de um lado ou de outro da fronteira mudasse a essência das pessoas. Isso não faz nenhum sentido. As fronteiras são convenções históricas e políticas, linhas imaginárias traçadas de acordo comum ou na base da força entre os habitantes de uma parte do território.

Dito de outro modo: os seres humanos são iguais ou muito semelhantes entre si, independente do lugar onde nasçam. Vêm ao mundo, crescem, vivem, trabalham e um dia morrem. Suas necessidades, aspirações, virtudes e imperfeições, a noção do certo e errado, são mais ou menos as mesmas em todas as culturas, em todas as pátrias.

É em nome da pátria – associado muitas vezes à religião – que se cometem os maiores desatinos, as guerras mais cruéis, o sofrimento e a mortandade de mulheres, crianças e idosos. O patriotismo, que vem a ser a mesma coisa que o nacionalismo exacerbado, desune, fragmenta, isola, reaviva animosidades e ódios ancestrais entre os povos e nações.

Na guerra do Leste Europeu os dois países contendores, Rússia e Ucrânia, exaltam o patriotismo e as respectivas pátrias. “ O patriotismo é a disposição para matar ou morrer por razões triviais” – do matemático, filósofo e pacifista inglês Bertrand Russel.

Nas retóricas mais arrebatadas, como na Cuba revolucionária, o “ patria o muerte “, no final não é a pátria que prevalece, mas a morte, a força bruta, a asfixia das liberdades.

Há um patriotismo humano, profundo e realmente virtuoso: é aquele que pensa toda a humanidade como pátria.

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