Segunda-feira, 10 de Março de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 10 de março de 2025
A secretária nacional de Mulheres do Partido dos Trabalhadores (PT), Anne Moura, afirmou que comitês de cultura criados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pela ministra da Cultura, Margareth Menezes, foram usados para eleger aliados em 2024 com o aval da cúpula da pasta e que “quem foi para a frente da prisão” precisa ter atendimento diferenciado na hora da “parte boa”.
Criado em setembro de 2023, o Programa Nacional de Comitês de Cultura (PNCC) vai custar R$ 58,8 milhões até o final deste ano com ações de mobilização, apoio e formação de artistas. É uma das principais iniciativas da pasta e foi anunciada por Lula ainda na pré-campanha de 2022.
As declarações da secretária, que tem base em Manaus (AM), são de setembro do ano passado, em uma reunião com o ex-chefe do comitê do Amazonas, Marcos Rodrigues. Eles romperam politicamente no fim do ano. A conversa foi gravada e registrada em cartório.
Em nota, Anne Moura afirmou que os questionamentos dela à atuação do ex-presidente da entidade cultural “podem estar sendo reproduzidos fora de seu contexto” e que o ex-aliado tenta macular a imagem dela. O Ministério da Cultura afirmou que relato sobre atuação de servidores da pasta é inverídico e informou que o comitê do Amazonas teve atividades suspensas e recursos bloqueados temporariamente para apuração de possíveis irregularidades.
No encontro gravado pelo ex-aliado, Anne Moura exigiu que Marcos Rodrigues envolvesse a estrutura do comitê na campanha dela a vereadora de Manaus – na qual acabou derrotada – e afirmou que a falta de empenho do comitê amazonense na política foi classificada como “um absurdo” pela secretária do MinC que cuida do PNCC, Roberta Martins, do PT do Rio de Janeiro.
Na gravação, ela também aparece reclamando de o comitê escolher artistas para atividades “sem combinar na política quem são os artistas parceiros” e disse que levou sua insatisfação ao conhecimento do secretário-executivo da pasta, Márcio Tavares. Número 2 de Margareth Menezes no ministério, antes de assumir o cargo ele era o secretário nacional de Cultura do PT, cargo do mesmo nível hierárquico do de Anne na estrutura do partido.
O PNCC contrata entidades culturais para receber verba pública e coordenar as ações e atividades de fomento à cultura nos Estados. A iniciativa beneficia militantes do PT e ONGs (Organizações Não Governamentais) ligadas a dois assessores do próprio ministério.
No Amazonas, o governo selecionou para coordenação o Instituto de Articulação de Juventude da Amazônia (Iaja), ONG que tem Anne Moura como uma de suas fundadoras e tinha como uns dos diretores Ruan Octávio da Silva Rodrigues (PT). Para coordenar o comitê, o Iaja vai receber R$ 1,9 milhão em dois anos. Militante do PT, Ruan Octávio é aliado dela em Manaus e hoje coordena no Amazonas o escritório do MinC.
O ministério afirma que as seleções das ONGs coordenadoras dos comitês de cultura se deram com base na capacidade técnica e na qualificação profissional dos contemplados. Na gravações, as declarações de Anne Moura, entretanto, indicam influência política e partidária dela na escolha. Segundo afirmou Anne Moura a Marcos Rodrigues, a aprovação do Iaja no Amazonas se deu por pressão dela mesma.
”Eu disse [para Roberta]: ‘pois é. Eu não sou de levar problema. E eu tô batalhando a minha batalha. Quando acabar, vou vir aqui, com o coordenador, com todo mundo que precisa ser respaldado. E eu quero pedir que vocês vão lá no Amazonas para botar cada um no seu lugar. Quero que tu diga da tua boca que fui eu que vim aqui pedir para ser aprovado o Iaja. Eu quero que você fale para eles lá. Porque as pessoas estão o tempo todo dizendo que não foi (…) Ela disse: ‘Isso é um absurdo, Anne. A gente faz política. Isso é um absurdo’. Pois, é. ‘Eu quero te pedir esse favor’.
Em outro trecho da conversa gravada, a secretária nacional de Mulheres do PT ameaçou uma intervenção no órgão federal de cultura no Amazonas por causa do protagonismo de André Guimarães, assessor de projetos do comitê de cultura amazonense e militante do PSOL. Ela também manifestou indignação pela não predileção por “artistas parceiros escolhidos na política” e com a participação de Wanda Witoto (Rede) em um ato público do comitê. Ambas disputavam parte de um mesmo eleitorado no pleito municipal.
Anne recebeu R$ 428,4 mil do PT para a campanha e conseguiu 2.399 votos. Wanda recebeu R$ 396 mil da Rede e obteve 8.374 votos, número de apoios que superou o de 19 dos 41 vereadores eleitos, mas ela não venceu por causa da somatória necessária na chapa proporcional. O parlamentar eleito com a menor votação teve 3.466 votos.
Procurada, a secretária do PT afirmou que desconhece o teor e que os questionamentos feitos por ela “podem estar sendo reproduzidos fora de seu contexto”. Ela evitou ponderar afirmações específicas que lhe foram apresentadas. Na manifestação, por escrito, disse lamentar a atitude do ex-presidente do Iaja e que ele tem como objetivo macular a imagem e a trajetória dela por motivações pessoais.
“Estou muito tranquila e à vontade para prestar quaisquer tipos de esclarecimentos aos órgãos competentes; tenho mais de 20 anos dedicados à luta do povo e nunca estive ligada a prática de nenhuma ilicitude”, frisou.
A atual presidente do Iaja, Samara Pantoja, disse desconhecer o compartilhamento do material de campanha da secretária do PT durante as eleições de Manaus.
O Ministério da Cultura afirmou ao Estadão que, ao contrário do que aparece na gravação, Anne Moura não teve conversas com servidores do ministério e que ela não tem relação com a escolha da ONG Iaja para coordenar o comitê de cultura no Amazonas.
Em nota, destacou que a secretária do PT “não é membro do comitê do Amazonas, nunca integrou sua equipe e não participou de qualquer processo relacionado ao Ministério da Cultura ou à seleção do edital de projetos”. (Estadão Conteúdo)
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