Sexta-feira, 22 de Novembro de 2024

Home Comportamento Tapa e trabalho ainda são aceitos como forma de educar, diz pesquisa

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Uma nova pesquisa de opiniões e percepções da população brasileira sobre a criação dos filhos revelou avanços na educação sobre a igualdade de gêneros e no repúdio aos maus-tratos, mas também explicitou contradições. Apesar de a maioria dos entrevistados – 71,8% – acreditar que a educação infantil deve ser feita a partir do diálogo, as pessoas se posicionaram a favor da restrição de liberdades e do uso da violência em certos contextos, como em uma possível solução para o jovem “não virar bandido” (62%). Uma parte significativa dos entrevistados (46%) também concordou com o trabalho infantil, principalmente como forma de “ocupar o tempo ocioso”.

A pesquisa foi uma iniciativa da Fundação Jose Luiz Egydio Setubal (FJLES) e do Instituto Galo da Manhã, que atuam em iniciativas sociais voltadas à infância e populações vulneráveis, e realizada pelo Instituto Ipsos em 134 municípios, ao longo do mês de novembro. Dividido em três eixos principais, o trabalho avaliou a percepção dos brasileiros em relação ao período da infância, que seria até os 14 anos, segundo opinião dos entrevistados; a opinião sobre maus-tratos; e os desafios e conhecimento sobre serviços de apoio e denúncia.

Os pesquisadores destacam resultados positivos e negativos. Entre as ditas surpresas agradáveis, está o aumento da ideia de igualdade de gênero na criação das crianças, já que 72,9% dos entrevistados responderam que meninos e meninas devem ser criados da mesma forma. A porcentagem foi semelhante ao índice de concordância com a criação na base do diálogo (71,8%).

Essa visão de mundo, porém, se choca com valores mais tradicionais ainda arraigados na população, como o apreço pela disciplina, hierarquia e a aceitação de punições físicas em contextos específicos. Enquanto 81,6% dos entrevistados afirmaram que a criança deve sempre obedecer os mais velhos, sem questionamentos, 62,5% concordaram com a frase ” é melhor bater hoje do que o filho virar um bandido”.

“Há um sentimento dúbio, a população reconhece a importância do diálogo, mas também a violência”, afirmou Marcos Paulo de Lucca-Silveira, professor de economia da FGV-SP e pesquisador da FJLES, que, junto a um comitê de especialistas em violência, analisou os resultados.

Pais comentam visões de criação

A cuidadora de idosos Renata Francisca Teles, de 37 anos, está entre os pais que acreditam que a palmada surte efeito no processo de educação dos filhos e serve como correção para que o filho não se desvirtue na idade adulta. Seguindo o exemplo que recebeu dos pais, ela conta que tem o diálogo como passo inicial para resolução de conflitos com os filhos de 15 e 3 anos, mas, acaso não obedeçam, não vê problema em “dar um tapinha na bunda”.

“Se damos um tapinha hoje somos reféns da justiça, mas se nossos filhos crescem com má índole somos culpados por não saber educar. Eu vim de uma família que o olhar bastava para que eu obedecesse e aqui em casa tento ser assim, mas meu filho mais novo, por exemplo, só obedece se eu disser ‘para, senão vou te bater’”, afirma.

Entre as variáveis socioeconômicas dos entrevistados, Silveira explica que os fatores de maiores influências foram o nível de educação e a reprodução da educação recebida na sua própria infância. Assim, pessoas com ensino superior e que responderam antes terem recebido criação baseada no diálogo foram os nichos que mais repudiaram o uso da violência. Já a idade e a origem geográfica, por outro lado, não exerceram muito impacto nos resultados.

Ao contrário de Renata e indo contra essa estatística da escolaridade, Elis Silva, de 43 anos, não defende a violência física na educação dos filhos. A confeiteira diz prezar pela conversa, mesmo em momentos de muito estresse. Apesar de ter tido uma infância rígida, no qual apanhava algumas vezes, ela acredita que o tapa pode estimular crianças a se revoltarem e terem medo dos pais.

Já o professor André Grimião se insere no perfil identificado pela pesquisa, de pessoas que receberam educação baseada no diálogo na própria infância e, assim, tendem a reproduzir a mesma filosofia com seus filhos. Para ele, que é pai de Antônio Carneiro, de 7 anos, não existe possibilidade de se estabelecer relação entre uso da violência e formação de uma pessoa boa.

“As pessoas que dizem que apanharam e hoje são pessoas do bem talvez nem saibam, mas podem manifestar essa violência sofrida em outras áreas da vida dela”, afirma Grimião, que também se diz contra o trabalho infantil e a favor da criação com igualdade de gêneros.

Aceitação de trabalho infantil

Em outro eixo do levantamento, os pesquisadores chamaram a atenção para o significativo apoio (46%) que os entrevistados deram à prática do trabalho infantil como forma de evitar que a criança fique ociosa. Essa justificativa superou até mesmo o argumento do trabalho infantil como ajuda financeira aos pais (26%).

“Essa justificativa mais aceita não era óbvia. Basicamente, a ideia do ócio se associa a ficar na rua. Isso é muito próprio da realidade brasileira, um posicionamento muito claro anti ócio, anti rua, que se reflete num modo como educar, porque vivemos numa sociedade que tem graus de violência e desigualdade. Isso se expressa no medo de virar bandido”, explicou Silveira.

Por último, a pesquisa também mostrou que apenas 33% dos entrevistados tomariam alguma ação se vissem crianças sofrendo maus-tratos na rua, chamando conselho tutelar ou abordando os responsáveis. A maioria (45%) respondeu que não agiria por desconhecer a situação ou não sentir necessidade de intervenção, e 17% disse que ficariam com medo de falar alguma coisa.

Associados a esses números, Silveira destacou que parte das pessoas desconhece instituições de apoio e de denúncia, como conselhos tutelares (10% desconheciam), ONGs (46%), Disque Denúncia (22%) e Centros de Assistência Social (18%). A pesquisa faz parte do 3º Fórum de Políticas Públicas da Saúde na Infância da FJLES, que termina nesta quarta. Ao final, o instituto lançará ações de prevenção contra violência infantil e incentivo e apoio a instituições parceiras que trabalhem nessa temática.

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