Sábado, 23 de Novembro de 2024
Por Redação Rádio Pampa | 25 de setembro de 2022
Ufa! A coluna número UM foi publicada e, superado o meu bloqueio criativo, sinto que finalmente conseguirei iniciar o nosso relacionamento por meio dessas linhas. Vocês podem não imaginar, mas a pressão interna para conseguir expressar tudo o que se passa dentro da nossa cabeça de forma ordenada, lógica e, ainda por cima, interessante é enorme. “Com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”, já diria Uncle Ben, o tio do Homem Aranha…
Esse incômodo me fez pensar muito na importância de resgatarmos, constantemente, a nossa essência. Eu sempre gostei de ler e escrever. Fui daquelas meninas certinhas, que liam todos os livros indicados na escola sem apelar para as resenhas que eram vendidas no “mercado paralelo” (lembrem-se que houve um tempo em que o Google não existia, muito menos podcasts com o resumo de obras de literatura). Devorava qualquer livro de mistério e li todos da Agatha Christie. Até mesmo aquele livro proibido sobre as agruras da vida da Christiane F. eu li (às escondidas, na moita da casa da praia, para os meus pais não verem — acho que eles ficarão sabendo dessa minha sapequice ao ler esta coluna). E aí escrevia textos, contos… e essa habilidade natural — que não era uma paixão, era apenas algo meu — virou um hobby. Comecei um blog lá nos primórdios, e não é que funcionou? Até hoje alguns leitores lembram dessa minha fase.
Ocorre que os tempos mudam. Parei de escrever.
Não sei se foi porque virei mãe e o tempo livre que me sobrava eu usava apenas para dormir e sobreviver. Pode ser. Talvez tenha sido o advento das redes sociais, cuja demanda é predominantemente visual: fotos e vídeos prendem a atenção instantânea dos nossos olhos e mantêm o nosso cérebro conectado. Passei a me esmerar em tirar fotos bonitas, sem o fundo poluído, e depois tive que aprender a dizer algo relevante em um vídeo de 15 segundos (se não tivesse nada relevante para dizer, fazer uma dancinha — faço isso até hoje, aliás). Talvez possa ter sido tantas outras coisas… mas o fato é que eu havia deixado de lado algo que era muito “meu” e eu sequer percebi.
Enquanto eu lidava com esse meu ebulitivo estado interior, várias pessoas me questionavam, em paralelo, sobre uma singela expressão que utilizei na semana passada, relativa à necessidade de as mulheres entrarem em uma fase de (re)conexão com o feminino. Isso soa estranho em tempos de busca por igualdade de gênero, espaço no mercado de trabalho, divisão equânime de tarefas domésticas. E toda essa luta travada desde o século XX por direitos que nos foram tirados por séculos — propriedade, representação política, direito até mesmo sobre o nosso próprio corpo! — foi (e continua sendo) essencial. O resultado do sacrifício de tantas mulheres antes de nós está aí: hoje, estamos gritando por igualdade salarial, por homens que compreendam que os cuidados com a casa e com os filhos dependem de ambos, por mais mulheres nos representando em todas as esferas de poder. Está dando certo.
Porém, lá no fundinho, temo que muitas dessas mulheres tenham deixado de lado algo importante: a sua essência. Primordialmente, a sua essência feminina.
Lá nos primórdios, talvez há milênios, as sociedades eram organizadas de forma que todos os seus membros fossem importantes e atuassem conforme as suas habilidades. Isso incluía, sim, as mulheres. As mulheres possuem características diferentes (felizmente!): costumam ser mais empáticas, sensíveis e propensas a se preocuparem com os demais. Costumam reunir conhecimentos empíricos sobre coisas do mundo para poder exatamente cuidar dos outros (quem já não tomou um chazinho especial para curar o resfriado ou uma receitinha especial para aquela queimadura de sol?). As mulheres são uma fortaleza emocional. Elas lidam com a força de dar a vida, mas, quando esta lhe é tirada, não há quem sofra mais. E, ainda por cima, seguem em frente. Ainda assim, costumam, por natureza, ter compleição física mais frágil — e, por isso, gostam de se sentir protegidas também. É quase uma reação natural e ancestral de quem morava em uma tribo e precisava de um corpanzil forte e peludo para matar o urso (lembrem-se: naquela época não existia depilação a laser). Ainda assim, as mulheres eram sacerdotisas, amazonas, rainhas. Sempre fomos fortes.
Só que o trem descarrilou no meio do caminho, por uns séculos ou outros, e só agora estamos botando os trilhos no lugar. Mesmo com o trem em movimento, penso que é tempo de voltarmos os olhos para dentro de nós.
Na verdade, eu já vejo esse movimento acontecendo. Timidamente, aos pouquinhos, mulheres falando no “sagrado feminino”. Começando a admitir que não é preciso se sentir envergonhada por gostar que um homem abra a porta do carro ou lhe traga uma flor. Admitindo, que, enfim, somos mulheres, que isso nos faz, sim, diferentes e que essa é a beleza do mundo.
Retornar à essência… as respostas estão todas lá: no que somos essencialmente. No que faz os nossos olhos brilharem e que flui naturalmente do nosso ser. No que nos leva a agir espontaneamente, apenas pelo prazer de fazê-lo. E a prova está aqui, neste texto, que finalmente se desenrola, letra a letra, tecla a tecla, quando me desapego e me entrego a… adivinha? Ela mesmo: a minha essência.
Ali Klemt
Apresentadora de TV
No Ar: Pampa News